Impulsividade: por que as crianças têm dificuldade para esperar?

Daniela Ceron-Litvoc

O mundo das crianças versus o mundo dos adultos

Nossas crianças não são miniadultos. Elas pensam e reagem diferente de nós exatamente porque são crianças.

Compreender o universo infantil permite criar formas de engajamento para as crianças. Fazer que elas queiram fazer aquilo que os adultos queremos que elas façam.

O afeto

Diferente do adulto, que tem o mundo dos pensamentos como central em sua organização, a criança é regida pelo afeto.

A pessoa mais importante, o ponto de referência, a melhor escola, tudo é determinado pelas trocas de emoções e sentimentos. Adultos se submetem com paciência à situações inapropriadas do ponto de vista afetivo por razões lógicas, crianças não.

Por isso, para que a criança compreenda o mundo do adulto, a única via possível é pela via do afeto.

Crianças são mais impulsivas que os adultos. Isso é normal e é dado pela imaturidade cerebral e psíquica. Ao mesmo tempo, pedimos que ela não seja impulsiva, que ela aceite restrições, que ela não grite quando contrariada, que aceite parar o videogame no meio da fase para um compromisso sem reclamar. Queremos que ela fique sentada por 5 horas na sala de aula. Queremos que ela funcione como um adulto.

O problema do tempo

Esperar é algo que aprendemos a fazer. Com maior ou menor dificuldade, ao longo do desenvolvimento, aprendemos a planejar atividades e aguardar o melhor momento para colocá-las em prática. Isso é pensar no futuro. Mas será que o futuro dos adultos é o mesmo que o das crianças? O tempo é o mesmo conceito em qualquer faixa etária?

A reposta é não. Por exemplo, quando falamos em futuro, a criança não compreende, do ponto de vista psíquico, um tempo distante da sua realidade imediata. Se contamos que algo que ela quer muito acontecerá daqui a 3 dias, ou 30 dias ou 3 meses, ela entende que demora, que é ruim esperar (demorar e esperar são atividades que acontecem no presente). Mas não saberá qual a diferença de quanto tempo demora.

O tempo, para criança, é o quanto dura uma atividade. Quanto tempo dura 3 meses? Para a criança de 5 anos: depois que passar a Páscoa, depois que chegar o Dia do Índio, quando começar as férias. E todos os dias ela perguntará: já chegou 3 meses?

Por isso, é importante que nós, adultos, pensemos na possibilidade real da criança em abdicar de algo que ela quer muito agora em prol de uma benefício no futuro. A nossa expectativa que ela seja menos impulsiva e mais racional. Que ela faça as escolhas certas.

Não ser impulsivo significa conter os ímpetos de ações imediatas, planejar e organizar algo para um futuro que chegará. A criança deve aprender isso e o papel de seus cuidadores é mostrar o quanto isso é importante. Mas não espere que ela tenha essa habilidade inata.

Para facilitar esse processo, procure criar programações claras e em um tempo curto. Utilize o maior poder sobre a sua criança: o afeto. Elas valorizam o que tem valor para o adulto, por desejarem ser fonte de orgulho e admiração por aquele que amam. Crie exemplos concretos e práticos que façam sentido, gratificações relacionadas às atividades cotidianas (e não a uma futuro distante como as férias de fim de ano ou ao super presente de natal). Engaje sua criança. Para isso você precisará de paciência, muito trabalho, carinho e insistência sem fim. Mas valerá a pena. É um planejamento para o seu futuro de pais e para o da sua criança.

Não a recrimine por ela não esperar, por querer tudo para agora, por não pensar em seu futuro. Isso é tarefa dos adultos.

Experiência de segurança

O mundo das crianças é um mundo mais inseguro. Tudo pode acontecer. Qualquer fantasia pode tornar-se realidade.

Se contamos para a criança que amanhã uma grande nave espacial invadirá a Terra e todos os humanos morrerão, pode ser que ela acredite piamente (desde que aquele que conta esteja imbuído nas reações emocionais adequadas para o evento).

Para nós, adultos, o passado funciona como uma ferramenta de estabilidade. Temos a expectativa que o mundo continue sendo o mesmo que sempre foi.

Para a criança, o adulto é a pessoa chave para passar a sensação de segurança. Por isso, cuidado com ameaças como: “assim eu não vou mais gostar de você” ou "eu vou embora para sempre”. Elas são muito mais aterrorizadoras do que benéficas e apenas servirão para abalar no que é mais importante para a sua criança: a relação afetiva que ela tem com você.

Uma frase como "eu não vou deixar você fazer isso porque eu te amo” terá muito mais efeito a longo prazo.

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